São Francisco Xavier cometeu um grande engano. Ao desembarcar no Japão em 15 de agosto de 1549, não havia dicionário algum de japonês para nenhuma língua europeia. Mesmo assim, o grande missionário basco iniciou a pregação do Evangelho falando sobre “Dai Nichi”. Ele pensava que essa palavra fosse a tradução para o japonês do “Deus Todo-poderoso” das Escrituras. Mais tarde ele descobriu, para a sua vergonha, que cometera um grave erro, pois “Dai Nichi” designava uma das manifestações de Buda.
Esse grave erro não impediu, porém, que a fé cristã lançasse raízes entre os japoneses. Com efeito, a fé não é uma doutrina a ser ensinada, é antes um dom recebido pelos que se deixam encontrar por Jesus.
Os cristãos japoneses tiveram que enfrentar uma duríssima perseguição. Menos de 50 anos após o início da evangelização, os cristãos colhiam os primeiros mártires: São Paulo Miki e seus companheiros (1597). Em 1641, a proibição do cristianismo se tornou ainda mais dura. Grandes recompensas foram oferecidas aos que davam informações que levassem à captura de sacerdotes e catequistas.
Por aproximadamente 250 anos, os cristãos viveram a fé cristã sem padres, sem imagens de santos, sem eucaristia. A comunidade cristã nomeou então a “Pessoa da água” para batizar, a “Pessoa do calendário” para lembrar as datas do advento, natal, quaresma, páscoa, etc., e o “Chokata” ou “Cabeça” para ser o chefe da comunidade cristã.
Até 1858, ano em que o Japão foi obrigado a se abrir para o mundo ocidental, os cristãos japoneses enfrentaram uma perseguição feroz que não se abrandou. No dia 17 de março de 1865, depois de um ano da conclusão da igreja de Oura, o padre Petijean recebeu um grupo de mulheres disfarçadas de pescadoras. Vinham com medo e entraram na igreja ocultamente, pois o cristianismo era ainda absolutamente proibido aos japoneses.
Uma delas, a sra. Yuri, perguntou ao padre: “Onde está a imagem de Santa Maria?” Ele as levou ao altar lateral e as mulheres exclamaram: “É ela! É ela!”. Havia na voz daquelas mulheres um alívio de séculos de espera.
Pense um pouco antes de continuar a leitura: aquelas mulheres nunca tinham visto uma imagem de Nossa Senhora! Nem a mãe delas! Nem a avó delas! Tampouco a bisavó delas! Somente a decavó tinha visto uma imagem de Nossa Senhora! Se considerarmos que uma geração dura aproximadamente 25 anos, constataremos que os cristãos japoneses conservaram e transmitiram integralmente a fé por 10 gerações.
Uma das mulheres ainda reconheceu nos braços de Maria o menino “Zezus”. O sacerdote reconheceu de quem elas falavam, mas para se certificar fez algumas perguntas básicas de catecismo e todas foram respondidas corretamente.
O padre então se disfarçou de agricultor e, mesmo correndo muitos riscos para si e para os cristãos japoneses, foi ao encontro da comunidade e celebrou a missa num estábulo revestido com palha de arroz para proteger seus pés do esterco.
Foram 10 gerações que viveram sem sacerdotes, sem imagens religiosas e sem eucaristia. Muitos foram os que morreram sem nunca ter recebido a comunhão eucarística nem tiveram o consolo de receber o perdão de Deus pelo sacramento. Os cristãos japoneses esperaram a eucaristia por 250 anos.
Atualmente muitos católicos do mundo todo vivem uma experiência semelhante: esperam a eucaristia, esperam a confissão, esperam poder celebrar os sagrados mistérios em comunidade. Creio que essa experiência de ter que esperar a eucaristia deva também nos chamar a atenção para tantos outros cristãos que por causa da perseguição religiosa são proibidos de manifestar publicamente a sua fé em Jesus Cristo ou que, por falta de padres, não podem celebrar a eucaristia com frequência.
A nossa espera pela eucaristia não durará 25 décadas, mas podemos aproveitar esse tempo de privação como uma longa e amorosa preparação para o Amado da alma.
Fonte: https://xaverianos.org.br/noticias-e-artigos/missiologia/1470-o-erro-de-sao-francisco-xavier