O Espírito divino que agia em Jesus fazia dele, por meio de suas palavras e ações, sinal e instrumento ativo da Palavra de Deus, fundamento da salvação. O Espírito divino que agia em Jesus, depois da sua morte e ressurreição foi enviado sobre a Igreja, chamando-a a tornar presente e eficaz a ação salvífica de Deus. Salvação que Deus continua a realizar por meio do Senhor ressuscitado, no poder do mesmo Espírito de Jesus, por meio de nós, pecadores, chamando-nos a ser membros do Corpo de Cristo, que é a Igreja. Assim, a Igreja é chamada a ser sacramento (sinal e instrumento) de comunhão com Deus, sal da terra e luz do mundo.
“A perspectiva pneumatológica também está presente na Lumen Gentium, ou seja, a Igreja sendo conduzida pelo Espírito Santo. É Deus quem age, que conduz a Sua Igreja. A Igreja, a partir da Lumen Gentium, não se pode pensar sem Jesus Cristo e sem o Espírito Santo, como condição fundamental para ela produzir frutos. O número 4 retrata muito bem essa consciência, porque a entende como a última determinação da Igreja. A Igreja não existe por si mesma, mas deve ser o instrumento de Deus, para reunir todas as pessoas nele e preparar o momento em que “Deus será tudo em todos” (cf. 1Cor 15,28).
O esquecimento disso converterá a Igreja em mera luta pelo poder e simples oposição de grupos internos, como demonstra o período posterior ao Concílio, pela valorização unilateral da imagem bíblica de Povo de Deus, de acordo com o Relatio Finalis do Sínodo de 1985[2].
Essa consciência, de não ser simplesmente uma associação ou agremiação humana, gera duas consequências. Uma, a superação de uma eclesiologia jurídica; e a outra, a consciência de uma nova relação com o Reino de Deus e com o mundo.
Sem dúvida alguma, a Lumen Gentium significa a superação de uma eclesiologia jurídica. Essa mudança de perspectiva faz com que a Igreja deixe de ser vista horizontalmente e a partir de si mesma, para ser compreendida verticalmente,
isto é, a partir de Deus e de sua presença nela. Como consequência, ela é o instrumento de Deus no mundo e tem a missão de proclamar a Boa-Nova do Reino de Deus. O que não significa afastamento do mundo, mas o assentamento de sua missão no essencial.
Papa Paulo VI define claramente a essência da Igreja na evangelização, as suas origens, passando pelos séculos de sua história, a evangelização é o que a Igreja tem de mais íntimo. Está bem evidente isso na Evangelii Nuntiandi, relembrado também no documento atual do Papa Francisco Evangelii Gaudium. Não precisamos ir em busca de uma identidade. Ela existe deste a Igreja primitiva. A recepção da eclesiologia do Vaticano II, feita pelo Sínodo Extraordinário dos Bispos, de 1985, destacou a eclesiologia de comunhão. Pode-se afirmar que a comunhão não tem um lugar central no Magistério do Vaticano II, contudo, a ideia da comunhão pode servir como síntese dos elementos essenciais da eclesiologia conciliar. Como lemos no texto da primeira carta de João: “O que vimos e ouvimos vo-lo anunciamos, para que estejais também em comunhão conosco. E a nossa comunhão é com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo. E isto vos escrevemos para que a nossa alegria seja completa” (1Jo 1,3-4). A comunhão tem como ponto de partida o encontro com o Filho de Deus, Jesus Cristo, que chega às pessoas pelo anúncio da Igreja. Assim acontece a comunhão com Deus e com a humanidade. O encontro com Cristo cria a comunhão com ele e, portanto, com o Pai no Espírito Santo, e a partir daí une as pessoas entre si. Assim, a palavra comunhão tem um caráter teológico, cristológico, histórico salvífico e eclesiológico, adquirindo uma dimensão sacramental, expressa pelo conceito da Igreja como sacramento de salvação.”
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1]. V. CODINA, Creio no Espírito Santo .Pneumatologia narrativa, Paulinas, S. Paulo, 1997, 55.
[2] Cf. SÍNODO DE 1985, Relatio Finalis II, A 3.
Fonte: vaticannews.va